domingo, 15 de março de 2009

Aqui são contados em versos a peleja de uma família pobre do Sertão mudando de moradia.

Mudança de pobre

Já escrevi vários temas
Que a história não encobre
E até fui premiado
Por este trabalho nobre
Mas hoje posso dizer
O que pode acontecer
Numa mudança de pobre.

Na vida de gente sofrida
Há muita coisa pra dizer
A começar pela peleja
Que tem pra sobreviver
Na luta do dia-a-dia
Por saúde e moradia
E o pão pra defender.

Uma mudança de pobre
Chama logo atenção
Pela troçada que existe
De guarda-louça a pilão,
Cadeira de pau tremendo
Perna de mesa rangendo
E um resto de colchão.

Na hora que arruma os “troço”
Causa logo uma estranheza
Dá impressão que aumenta
Os cacos que ele maneja
Mas não quer esquecer nada
Da sua vasta troçada
E segue nesta peleja.

Um tamborete enfadado
Com as pernas se abrindo
Uma tipóia de rede
Com a tanga se puindo
Ajunta tudo num saco
Usando até um bisaco
Pra botar o que vai surgindo.

Pega as peças do moinho,
A prateleira empenada
Que só segura com calço
Pra colocar a troçada.
Uma peneira, um pilão,
Ralo copeira, chicão
E a bateria enferrujada.

Rádio de pilha fanhoso,
Espingarda socadeira.
Um pote pra beber água,
Botina pra ir à feira.
Uma mala “veía” de couro
Que chega fica aquele estouro
Quando bota a mulambeira.

Tira os santos da parede
E cobre com uma toalha:
Jesus, Maria, José
Que é um trio que não falha.
É por isso que o nordestino
Não perde a fé no Divino
Nem de frente pra navalha.

A ferramenta de trabalho
Não pode ficar pra trás
A picareta, a enxada
A foice de corte sagaz
Chapéu de palha amassado
Cabaça, faca, machado
E o lampião de gás.

Os cacos que são mais frágeis
Tem que ter todo cuidado
Porque se não o solavanco
Pode deixar algum quebrado
E com todo este alvoroço
Esquecem até do almoço
E o jantar fica atrasado.

O cachorro vira-lata
Fica meio desconfiado
Estranhando a mudança
Correndo pra todo lado
Lambendo as pernas do dono
Com medo do abandono,
E depois ser maltratado.

O dono lhe faz um afago
E conta para o vizinho
As aventuras que teve
Nas caçadas com o cãozinho
E apesar de tanto apuro,
Sempre possui um pé-duro
Pra não passar fome sozinho.

Chega a hora da mudança
E a família se alvoroça
Para empilhar os pertences
Em cima de uma carroça
Mesmo vagaroso e chato
É o transporte mais barato
Que se encontra na roça.

Sei que uma coisa é certa
Que todo mundo comenta
Pode ser qualquer mudança
Quando se mexe aumenta
Você pode observar
Quando alguém vai se mudar
Quase sempre se lamenta.

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